Carro usado pode virar uma novela
Após o golpe milionário aplicado pela revendedora de veículos Emily Car, em Curitiba, lesando mais de uma centena de clientes, as lojas do ramo entraram em alerta, e o consumidor também. Até porque o caso da revendedora, desvendado mês passado, não foi o primeiro desse tipo a ser denunciado nas delegacias da capital.
Outras revendas, como a Via Kennedy - que teve o proprietário preso recentemente - também são alvo de inquéritos instaurados pela polícia por meio de relatos de pessoas prejudicadas na hora de vender o veículo, seja pelo não recebimento do dinheiro ou por problemas envolvendo a documentação. A orientação, nesse caso, é certificar-se da idoneidade do estabelecimento antes de fechar o negócio.
O presidente da Associação de Revendedores de Veículos Automotores do Paraná (Assovepar), Lidacir Antônio Rigon, garante que é fácil abrir uma revenda de veículos. Difícil, mesmo, é dar garantias ao consumidor, que é o que se deve buscar nesses casos. “A pessoa aluga um terreno, pede placa de uma instituição financeira, um telefone, fax, pega o carro dele, de um familiar, de outros conhecidos, coloca mais alguns consignados e está pronta a loja. Tanto que muitos atuam na clandestinidade, até mesmo sem alvará ou cadastro na Receita Estadual”, alerta.
A associação é uma forma de dar garantias ao comprador, mas congrega hoje, das 1.570 lojas da região da capital, apenas 200, sendo 160 na Grande Curitiba (menos de 10% do total) e as outras 40 no interior. “O consumidor, num universo desse, fica desprotegido”, diz. As lojas associadas, segundo ele, têm de oferecer as garantias da lei, como contra problemas mecânicos, de multas ou ligados à documentação. “Se a loja apresentar problemas e não solucioná-los, a associação intervém e exige da revenda um posicionamento”, explica.
Garantias
No entanto, como os serviços oferecidos por estas lojas são variados vão desde “troco na troca” até o refinanciamento do veículo ou a simples venda do carro vale se armar de informações para garantir seus direitos. Muitas vezes, o desconhecimento da necessidade de posse de um determinado documento ou a não verificação da transferência de um financiamento, por exemplo, são fatores que levam o cliente a perdas de difícil e lenta solução. “Quando vendem seu veículo, você tem direito de receber na hora o dinheiro e o documento de transferência (DUT) só é entregue nesse momento. Tem gente que deixa o DUT na mão do lojista na boa-fé ou aceita um pré-datado e, depois, não tem mais o que fazer”, avisa Rigon.
Informe-se antes de entregar o seu bem
E se a promessa é vender o carro por um preço superior ao de mercado (sem falar na comissão da loja), desconfie. “Tem de ter coerência na proposta. Muitos consumidores foram lesados porque se deixaram levar pela falsa promessa de que iam receber um valor maior do que sabiam valer seu carro”, avisa Lidacir Rigon.
Buscar informações sobre a revenda também é importante. A Junta Comercial, nesse caso, é uma boa fonte. A certidão simplificada, emitida pelo nome do estabelecimento ou CNPJ, fornece dados como idade da loja, capital, nome dos sócios, além de fornecer possíveis pendências junto às receitas Federal e Estadual ou processos na Justiça. Vale, ainda, verificar a existência de alvará na Prefeitura. Caso exista o documento, é importante conferir se o ramo declarado condiz com o tipo de negócio praticado e, se não for o caso, denunciar o estabelecimento.
A advogada Cláudia Silvana, do Procon-PR, afirma que, caso o consumidor seja lesado, deve procurar a Justiça, assim como estão fazendo os clientes que se sentiram lesados pela Emily Car. “Mas o ideal é se precaver, porque geralmente as denúncias no Procon dizem respeito a vícios de produtos. O primeiro cuidado deve ser verificar o estado do veículo, com mecânico de sua confiança. Não que isso exima o vendedor de dar garantias, mas a prevenção é o melhor negócio. Conferir com o despachante se não há multas, IPVA em atraso ou se o carro não sofreu sinistro também é bom.” Além disso, vale consultar junto ao órgão se já foram registradas reclamações contra a loja com que pretende negociar. (LM)
Polícia instaura inquérito contra empresários
O caso Emily Car chamou atenção também pelas conseqüências: além do inquérito principal, a polícia já abriu outros 40 inquéritos contra os proprietários da loja, foragidos da Justiça. Recentemente, foi preso Mário Duarte de Araújo, responsável pela Via Kennedy Veículos, na Vila Guaíra, segundo a polícia. “Desde 2006 já havia inquéritos tramitando contra ele. Só nessa última situação (que culminou na prisão), foram vitimadas oito pessoas, além dos seis inquéritos anteriores, todos tratando de apropriação indébita e estelionato”, explica o delegado do 8.º Distrito Policial de Curitiba, Alcimar de Almeida Garret.
Semana passada, o acusado teve o pedido de habeas corpus negado. “Em alguns casos, ele recebia o veículo em consignação, vendia e deixava de pagar a parte cabida ao antigo proprietário e, em outros, ficava com o veículo financiado, revendia e não quitava os débitos, prejudicando tanto ao antigo proprietário como ao comprador”, afirma.
Segundo o delegado, denunciar esse tipo de crime é importante porque muitos proprietários acabam acertando as contas com os clientes antes de as conseqüências se tornarem mais graves. “Na hora da intimação, para evitar um inquérito, preferem pagar o que devem”, diz.
O delegado Luís Alberto Salles, do 4.º Distrito, conta que também já registrou denúncias contra revendas de carros, uma delas envolvendo vários clientes, no Santa Cândida. Os crimes são semelhantes aos da Emily ou Via Kennedy. “Mas os donos ficaram foragidos e permanecem assim até hoje”, afirma. O contrário, porém, também acontece. Semana passada, foi o dono de um veículo que falsificou um documento a fim de tentar enganar o revendedor. “Por isso, para os dois lados, é preciso ter cuidado e sempre conferir tudo pessoalmente para evitar prejuízos.”
Fonte: Paraná Online