Registro de doenças ocupacionais cresce 134%
O registro de doenças ocupacionais deu um salto nos últimos 11 meses. As notificações de doenças do sistema osteomuscular, nas quais se incluem as lesões por esforço repetitivo (LER) e que representam 84,77% do total de doenças do trabalho, aumentaram 512,3%, segundo dados do Ministério da Previdência.
A impressionante variação é creditada ao Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário (NTEP), mecanismo que relaciona determinada doença às atividades nas quais a moléstia ocorre com maior incidência. Em vigor desde abril do ano passado, o nexo obriga a perícia do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a aplicar uma lista que relaciona cada uma das profissões às doenças de maior incidência na atividade.
Como resultado dessa co-relação, a doença é classificada automaticamente como ocupacional. Assim, o que aconteceu, preponderantemente, não foi um maior número de casos de doenças, mas uma elevação no volume de moléstias classificadas como ocupacionais.
Para medir o efeito do nexo epidemiológico, o ministério comparou o número de moléstias ocupacionais registradas nos 11 meses antes (maio de 2006 a março de 2007) e depois (abril de 2007 a fevereiro de 2008) da adoção da regra. O maior salto é no capítulo do Código Internacional de Doenças (CID) referente às doenças infecciosas e parasitárias: 3.701%. Depois, vem a alta no grupo dos tumores (2.102%), seguido pelas doenças do aparelho circulatório (1.406%). No total, o aumento foi de 134%.
Novo mecanismo
Para a Previdência, o salto revela que, antes do novo mecanismo, grande parte das doenças ocupacionais era anteriormente classificada como moléstias comuns, sem relação com o trabalho. O diretor de Saúde Ocupacional do Ministério da Previdência, Remígio Todeschini, diz que o nexo vem mostrando a deliberada conduta anterior das empresas em tratar as moléstias como comuns e não notificar as doenças como ocupacionais. Na prática, isso acontece com a emissão da Comunicação de Acidente do Trabalho (CAT).
Quando a moléstia é classificada como decorrente do trabalho, explica Todeschini, o empregador fica obrigado ao recolhimento do FGTS. Além disso, há maior estabilidade garantida aos afastados. Para o diretor, as empresas também preferem a classificação da doença como comum e não como ocupacional, já que isso preserva os índices de "acidente zero".
"O NTEP é uma boa radiografia do ambiente de trabalho e revela a enorme subnotificação. Antes dele, em 2006, a média era de 30 mil notificações por ano. Depois dele, saltou para 144 mil", diz o diretor. O nexo, segundo ele, dá mais clareza sobre onde estão adoecendo os trabalhadores e quais são as políticas públicas necessárias.
Gasto bilionário
A Previdência tem um gasto bilionário com o pagamento de benefícios acidentários - principalmente auxílio-doença - e aposentadorias especiais concedidas em decorrência de ambientes insalubres, perigosos e penosos. Em 2005, a despesa foi de R$ 9,83 bilhões. Em 2007, subiu para R$ 10,72 bilhões. O aumento dos registros como acidentários (relacionados à profissão) não indica que a conta da Previdência vai crescer na mesma velocidade. Esses auxílios já eram pagos, mas como benefícios "previdenciários", como se a doença fosse comum.
Para Todeschini, os números da Previdência mostram que a LER é a doença mais omitida pelos empregadores. O nexo indica que os cinco segmentos de atividade que mais concentram sua ocorrência são intermediação financeira, comércio varejista, montagem de veículos, alimentos e bebidas e serviços às empresas. No ano passado, a LER foi responsável por 37,77% dos afastamentos acidentários.
O diretor comparou os números de 2006 da Relação Anual de Informações Sociais (Rais) - detalhamento do emprego formal - com os acidentes registrados nas Comunicações de Acidentes de Trabalho (CATs) naquele ano e concluiu que, proporcionalmente, a faixa etária mais exposta a acidentes foi de trabalhadores até 19 anos. Em números absolutos, a faixa foi a de 30 a 35 anos.
Números da Rais
Esse cruzamento entre os números da Rais e das CATs, em 2006, também mostra que o setor com mais ocorrências no âmbito da saúde ocupacional foi o dos serviços industriais de utilidade pública. Naquele ano, nos 344.565 postos de trabalho, foram levadas ao INSS 12.302 CATs. Nessa classificação, seguem-se, em ordem decrescente: indústria de transformação, extração mineral, agropecuária, construção civil, serviços, comércio e administração pública.
Com a evolução do nexo, a Previdência vai definir o Fator Acidentário de Prevenção (FAP) que passa a valer no ano que vem. Atualmente, as empresas recolhem de 1% a 3% do valor de suas folhas de pagamento como contribuição ao Seguro Acidente do Trabalho (SAT). O objetivo é premiar a empresa que investir em segurança e reduzir suas ocorrências. Nesse caso, ela vai pagar contribuição menor ao SAT.
Por meio do FAP, o critério será por empresa e a contribuição ao seguro será de 0,5% até 6% da folha de pagamentos. Hoje, o critério é setorial, pela Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) e vai de 1% a 3% da folha. Mas a mudança provocada pelo FAP terá o teto equivalente ao dobro do percentual pago atualmente. Portanto, não vai haver o salto de 1% para 6% nessa contribuição.
Aperfeiçoar programas de prevenção
Todeschini recomenda que, em benefício próprio e dos seus trabalhadores, as empresas devem aperfeiçoar seus programa de prevenção, prestigiar a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (Cipa) e fomentar a cultura permanente da educação e da prevenção.
Mas ele também reconhece que o governo tem muito a realizar. Como exemplo, cita a retomada da Política Nacional de Segurança e Saúde do Trabalhador que deve articular as ações de três ministérios: Trabalho, Previdência e Saúde.
Outra falha do governo, na opinião de Todeschini, é a insuficiente estrutura de fiscalização. Numa comparação que ele chama de "grosseira", a Alemanha tinha, em 1992, população economicamente ativa (PEA) de 45 milhões de pessoas e aproximadamente cinco mil fiscais do trabalho.
No Brasil, a PEA atual é de 90 milhões de pessoas, mas há apenas 3,8 mil fiscais. Um agravante da situação brasileira é a alta informalidade da economia que exclui milhões de trabalhadores das redes de proteção previdenciária.
Fonte: DIAP